segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Uma vez alguém já disse: “Não gosto de política”.

Não poucas vezes, ouvimos, à boca pequena, expressões como essas: “Odeio política”, “Não gosto de política”, “Tenho nojo de política”..., Principalmente em tempos de eleição. A política parece sempre ocupar os extremos do amor e do ódio, do ame-a ou deixe-a, da alegria e da tristeza, do bem e do mal, do calor e do frio, do grito e do silêncio, do conformismo e do ativismo. Assim é a política na boca de milhares de pessoas, ou doce ou amarga ou agridoce.
Para vulgarizarmos um pouco menos e não banalizarmos por demais a palavra política é importante entendermos três acepções sobre ela: a primeira assume uma conotação de governo, autoridade e administração da coisa pública ou do tesouro de todos, sob a forma de Estado; a segunda dá a idéia de atividade realizada por especialistas, profissionais, políticos pertencentes a um certo tipo de organização sociopolítica – os partidos – que disputam o direito de governar, ocupando cargos e postos no Estado; por fim, este último significado advém do anterior porque é o mais popular, no sentido de ser o mais corrente por se tratar de uma visão negativa da política, admitindo colocar sob suspeita as práticas secretas de quem exerce o poder e se beneficia dele.
O calor político é produzido pela oposição dos três sentidos mencionados acima, que na prática se confirma mais ainda. Aflora-se, com isso, um paradoxo na divergência entre o primeiro e o último sentido da palavra política, pois o primeiro se refere a algo geral concernente à sociedade como um todo com suas leis e seus costumes, seus direitos e obrigações, reivindicações, resistências e desobediências, enquanto o último sentido afasta a política de nosso alcance, blindando-a. Daí, muitas interpretações parecem viáveis acerca da política ou de quem administra a coisa pública; que vão desde os casos de corrupção aos casos de transparência e de lisura administrativa.
Costumo colocar num mesmo patamar o atemporal, o misantropo, o apolítico, o a-histórico uma vez que todos eles tentam sublimar os problemas pertinentes à existência. É da natureza da própria existência inserir-nos no mundo dos contrários da política porque somos seres sociais, carregados de história e sujeitos ao tempo e ao espaço. Implicações como essas não nos permitem fugir da nossa condição de seres políticos, tampouco afirmarmos que “não gostamos de política”.
“Não gostar de” significa não desejá-la, não sentir prazer pela política. Não querer bem a política. Muito embora acredite que pelo simples fato de “não gostar” não quer dizer que venha a negá-la. “Não gostar” aqui está muito mais próxima da indiferença e da dissimulação do que da negação, da extinção. Não se trata de negá-la. Se assim for, é até mais suportável tal estranhamento. Do contrário, estaríamos agredindo a nós mesmos enquanto “animais políticos”, no dizer de Aristóteles. Como não estranhar tal repulsa!
Fora justamente a banalização do termo “política” ou o desgaste usual dela desde a Antiguidade que possibilitou a criação de escamas negativas em torno de seu rico significado. Isso diz o essencial da vida social em geral, e da política em particular: que são sempre coletivas e conflituosas. Diria Kant, “Insociável sociabilidade”. Por que os homens são injustos? Por que os homens são corruptos? Por que os homens são maus? Nada disso. Mas porque são egoístas, incapazes de viver sozinhos, pois, “homem algum é uma ilha”, afirmou Thomas Merton.
Engana-se quem pensa que a política é ausência de conflitos e uma bela auréola de paz e harmonia. E para nos livrarmos mais desse preconceito, deixo literalmente uma passagem do Livro “A vida humana” do filósofo francês André Comte-Sponville, 68p.:


“Engana-se quem vê na paz ausência de conflitos, o reino do consenso ou do interesse geral em tudo. Se assim fosse, não teríamos mais necessidade de política: a administração e a técnica bastariam. Estamos longe disso, felizmente(...). É para isso que servem nossas eleições, nossos parlamentos, nossos referendos. Democracia não é ausência de conflitos; é uma maneira de assumi-los e resolvê-los – sem os abolir – sem ser pela violência. Uma eleição vale mais que a guerra civil. Um parlamento, mais que um tirano. Ainda é preciso que haja vários partidos diferentes, que não se oponham apenas sobre insignificâncias(...). A política, diria eu, ao contrário de Clausewitz, é a guerra continuada por outros meios. Equivale a dizer que é um dos mais formidáveis progressos da história da humanidade e a única forma efetiva de paz. Por isso o apolitismo é um erro; o individualismo, um defeito. Ninguém luta sozinho, porque só se luta contra alguém, só se tem chances de ganhar, na escala da sociedade, junto com outros...(...)”.

Agora, portanto, pense bem antes de dizer: “Não gosto de política”.



Jackislandy Meira de M. Silva, professor e filósofo.
Confira os blogs:
www.umasreflexoes.blogspot.com
www.chegadootempo.blogspot.com

Um comentário:

Luís disse...

Eu até ia te responder, mas aí eu vi essa foto dos caras-pintadas e desisti.

Vai falar de política e usa o maior exemplo de que o povo é realmente um gado dos meios de comunicação?

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segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Uma vez alguém já disse: “Não gosto de política”.

Não poucas vezes, ouvimos, à boca pequena, expressões como essas: “Odeio política”, “Não gosto de política”, “Tenho nojo de política”..., Principalmente em tempos de eleição. A política parece sempre ocupar os extremos do amor e do ódio, do ame-a ou deixe-a, da alegria e da tristeza, do bem e do mal, do calor e do frio, do grito e do silêncio, do conformismo e do ativismo. Assim é a política na boca de milhares de pessoas, ou doce ou amarga ou agridoce.
Para vulgarizarmos um pouco menos e não banalizarmos por demais a palavra política é importante entendermos três acepções sobre ela: a primeira assume uma conotação de governo, autoridade e administração da coisa pública ou do tesouro de todos, sob a forma de Estado; a segunda dá a idéia de atividade realizada por especialistas, profissionais, políticos pertencentes a um certo tipo de organização sociopolítica – os partidos – que disputam o direito de governar, ocupando cargos e postos no Estado; por fim, este último significado advém do anterior porque é o mais popular, no sentido de ser o mais corrente por se tratar de uma visão negativa da política, admitindo colocar sob suspeita as práticas secretas de quem exerce o poder e se beneficia dele.
O calor político é produzido pela oposição dos três sentidos mencionados acima, que na prática se confirma mais ainda. Aflora-se, com isso, um paradoxo na divergência entre o primeiro e o último sentido da palavra política, pois o primeiro se refere a algo geral concernente à sociedade como um todo com suas leis e seus costumes, seus direitos e obrigações, reivindicações, resistências e desobediências, enquanto o último sentido afasta a política de nosso alcance, blindando-a. Daí, muitas interpretações parecem viáveis acerca da política ou de quem administra a coisa pública; que vão desde os casos de corrupção aos casos de transparência e de lisura administrativa.
Costumo colocar num mesmo patamar o atemporal, o misantropo, o apolítico, o a-histórico uma vez que todos eles tentam sublimar os problemas pertinentes à existência. É da natureza da própria existência inserir-nos no mundo dos contrários da política porque somos seres sociais, carregados de história e sujeitos ao tempo e ao espaço. Implicações como essas não nos permitem fugir da nossa condição de seres políticos, tampouco afirmarmos que “não gostamos de política”.
“Não gostar de” significa não desejá-la, não sentir prazer pela política. Não querer bem a política. Muito embora acredite que pelo simples fato de “não gostar” não quer dizer que venha a negá-la. “Não gostar” aqui está muito mais próxima da indiferença e da dissimulação do que da negação, da extinção. Não se trata de negá-la. Se assim for, é até mais suportável tal estranhamento. Do contrário, estaríamos agredindo a nós mesmos enquanto “animais políticos”, no dizer de Aristóteles. Como não estranhar tal repulsa!
Fora justamente a banalização do termo “política” ou o desgaste usual dela desde a Antiguidade que possibilitou a criação de escamas negativas em torno de seu rico significado. Isso diz o essencial da vida social em geral, e da política em particular: que são sempre coletivas e conflituosas. Diria Kant, “Insociável sociabilidade”. Por que os homens são injustos? Por que os homens são corruptos? Por que os homens são maus? Nada disso. Mas porque são egoístas, incapazes de viver sozinhos, pois, “homem algum é uma ilha”, afirmou Thomas Merton.
Engana-se quem pensa que a política é ausência de conflitos e uma bela auréola de paz e harmonia. E para nos livrarmos mais desse preconceito, deixo literalmente uma passagem do Livro “A vida humana” do filósofo francês André Comte-Sponville, 68p.:


“Engana-se quem vê na paz ausência de conflitos, o reino do consenso ou do interesse geral em tudo. Se assim fosse, não teríamos mais necessidade de política: a administração e a técnica bastariam. Estamos longe disso, felizmente(...). É para isso que servem nossas eleições, nossos parlamentos, nossos referendos. Democracia não é ausência de conflitos; é uma maneira de assumi-los e resolvê-los – sem os abolir – sem ser pela violência. Uma eleição vale mais que a guerra civil. Um parlamento, mais que um tirano. Ainda é preciso que haja vários partidos diferentes, que não se oponham apenas sobre insignificâncias(...). A política, diria eu, ao contrário de Clausewitz, é a guerra continuada por outros meios. Equivale a dizer que é um dos mais formidáveis progressos da história da humanidade e a única forma efetiva de paz. Por isso o apolitismo é um erro; o individualismo, um defeito. Ninguém luta sozinho, porque só se luta contra alguém, só se tem chances de ganhar, na escala da sociedade, junto com outros...(...)”.

Agora, portanto, pense bem antes de dizer: “Não gosto de política”.



Jackislandy Meira de M. Silva, professor e filósofo.
Confira os blogs:
www.umasreflexoes.blogspot.com
www.chegadootempo.blogspot.com

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Luís disse...

Eu até ia te responder, mas aí eu vi essa foto dos caras-pintadas e desisti.

Vai falar de política e usa o maior exemplo de que o povo é realmente um gado dos meios de comunicação?

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